Volume 24 - Robinson Suíço - Johann Rudolf Wyss
O vigésimo-quarto volume da coleção Clássicos da Literatura Juvenil apresenta, de início, uma curiosidade: ele foi composto a seis mãos. Embora ele traga o acadêmico, professor de filosofia e editor de folhetim Johann Rudolf como autor, ele foi na verdade escrito por seu pai, Johann David, e ilustrado por seu irmão, Johann Emmanuel Wyss.
Evidentemente, Robinson Suíço, publicado em 1812, foi inspirado em Robinson Crusoé, já apresentado nesta coleção. Como forma de evitar longas e chatas análises comparativas que seriam para lá de óbvias, vale a pena destacar aquilo que a obra traz, segundo a leitura desta que vos escreve, de notável.
O primeiro e mais destacável dos pontos da obra da família Wyss é o didatismo com que o livro foi escrito. O desejo de Johann David Wyss era compor uma obra tão importante e tão bonita quanto a de Daniel Defoe, mas que pudesse ser facilmente lida pelas crianças. Assim, diferentemente de seu predecessor, a obra do escritor suíço já nascia com um público-alvo infantil e juvenil definido, e tal objetivo delineou a obra e o tom usado nela.
Uma família de suíços – os Starks – viajam rumo à América para ali se estabelecerem em terra herdada pelo patriarca, quando uma tempestade quase leva o navio a pique, prendendo-o num banco de areia próximo a uma praia daquilo que não se sabe ser ilha ou costa de continente. Resignados, pai, mãe e os quatro filhos homens, variando de idade dos 8 aos 15 anos, descem para reconhecimento da terra nova. Começa aí a aventura de colonização da terra, com um vocabulário amplamente explicativo das plantas, das aves, da pesca e de toda a vasta caça da região, bem como dos diferentes tipos de terreno ali encontrados, incluindo grutas com estalactites, sal e gesso, além de toda a carga animal, vegetal e de instrumentos e roupas que transportam do navio atracado até as fortificações que constróem.
O empreendedorismo, a disciplina rígida e o trabalho em grupo resultam na criação de vários pontos de estadia, além de currais, celeiros, plantações, pastos, e até mesmo uma casa na árvore para toda a família. Em todo o livro, jamais o tom de lamento, de saudade ou de desespero aflora – pelo contrário: trata-se, antes de tudo, de manter o espírito são, o corpo sadio pelos exercícios e pelo trabalho, e a boa educação europeia em constante uso. Corrobora para isso a biblioteca do navio e o forte espírito protestante que marca toda a narrativa do que na verdade é um manual altamente moralizante.
De todas as passagens, vale a pena destacar, como ponto alto neste romance sem grandes intenções literárias dadas a clímax, o primeiro dia de descanso da família (que, como se espera, foi num domingo). Nesse dia, o pai senta-se e conta à família a história de duas terras pertencentes ao mesmo Rei: o Reino da Possibilidade, ou da Noite; e o Reino da Realidade, ou do Dia. No primeiro, longíquo, escuro e frio, nada se fazia, e a inatividade era a nota sonante do lugar. No segundo, operava-se o milagre da ação e das grandes realizações, e ali morava o Rei em Himmelburg, o Castelo Celeste, com os bons súditos, em meio a muita luz, paz, produtividade, e a vestimentas mais brilhantes que a prata. Ora, decide o Rei dar aos moradores do Reino da Possibilidade de passarem ao Reino da Realidade. Para isso, realizariam o trabalho de lavrar a terra, guardar um dia ao mês para discutirem as leis, descansar uma vez por semana, e observarem os respeitos e os costumes. Onde? Em Erdheim, ou Ilha Terrestre, a meio caminho de um e de outro. Juram todos obedecerem mas quando são levados para lá, poucos realmente se prendem à promessa esquecida no meio da bruma da viagem. O resultado é o esperado: de quando em quando, dois navios aportam na ilha: o Navio do Desespero e o Navio da Esperança. O primeiro aporta na orla e sua tripulação, comandada pela Morte, sai à caça de todos os preguiçosos e maus, enquanto o seguindo ancora a uma distância da praia e manda somente uma pequena embarcação com um único tripulante, que sob a ordem do comandante Vida recolhe os bons e laborosos moradores da ilha, para levá-los ao Castelo Celeste, onde morarão com o Rei e os outros súditos. No final, sobre o tamanho das embarcações e seus destinos, o pai conclui “dizendo que a Esperança sempre procurada fica distante de nós; por isso esformçamo-nos para alcançar o que ela significa ou representa, ao passo que o Desespero está sempre próximo e nos aflige com sua presença constante. [...] Os homens bons, cumpridores dos seus deveres, leais para com os outros e para consigo mesmos, têm a seu favor o bafejo da esperança que se torna realidade, ao passo que os outros tentam inutilmente fugir ao desespero, ficando enredados pelas trevas da maldade, da ignorância, da ociosidade” (WYSS, 1812; 1972: 64-5).
Independentemente da validade e da verdade contidas nesta parábola, o que ela sinaliza é a mão rígida do religioso e cidadão que se torna líder desta colônia, além de pai de filhos que mais tarde virão a se mostrar bons cidadãos. Esta aura de rididez e de forte moral, calcadas no protestantismo, são herdadas de um século em que a literatura, quando não fundada nos princípios filosóficos e iluministas da França, da América do Norte e da Inglaterra (em parte, como é o caso de Thomas Paine, autor dos Direitos do Homem), estava amplamente fundamentada na herança religiosa puritana herdada dos idos do século XVII,contra a qual o século XVIII lutou e só se viu efetivamente livre no século XIX. Mesmo assim, Robinson Suíço é uma obra que se imortalizou porque, no apagar das luzes, os princípios de cidadania, de religiosidade e de propriedade, muito bem calcados na sociedade ocidental, são os que prevalecem e nos dirigem até hoje.
Fonte de informações sobre o autor: http://en.wikipedia.org/wiki/Johann_David_Wyss
Evidentemente, Robinson Suíço, publicado em 1812, foi inspirado em Robinson Crusoé, já apresentado nesta coleção. Como forma de evitar longas e chatas análises comparativas que seriam para lá de óbvias, vale a pena destacar aquilo que a obra traz, segundo a leitura desta que vos escreve, de notável.
O primeiro e mais destacável dos pontos da obra da família Wyss é o didatismo com que o livro foi escrito. O desejo de Johann David Wyss era compor uma obra tão importante e tão bonita quanto a de Daniel Defoe, mas que pudesse ser facilmente lida pelas crianças. Assim, diferentemente de seu predecessor, a obra do escritor suíço já nascia com um público-alvo infantil e juvenil definido, e tal objetivo delineou a obra e o tom usado nela.
Uma família de suíços – os Starks – viajam rumo à América para ali se estabelecerem em terra herdada pelo patriarca, quando uma tempestade quase leva o navio a pique, prendendo-o num banco de areia próximo a uma praia daquilo que não se sabe ser ilha ou costa de continente. Resignados, pai, mãe e os quatro filhos homens, variando de idade dos 8 aos 15 anos, descem para reconhecimento da terra nova. Começa aí a aventura de colonização da terra, com um vocabulário amplamente explicativo das plantas, das aves, da pesca e de toda a vasta caça da região, bem como dos diferentes tipos de terreno ali encontrados, incluindo grutas com estalactites, sal e gesso, além de toda a carga animal, vegetal e de instrumentos e roupas que transportam do navio atracado até as fortificações que constróem.
O empreendedorismo, a disciplina rígida e o trabalho em grupo resultam na criação de vários pontos de estadia, além de currais, celeiros, plantações, pastos, e até mesmo uma casa na árvore para toda a família. Em todo o livro, jamais o tom de lamento, de saudade ou de desespero aflora – pelo contrário: trata-se, antes de tudo, de manter o espírito são, o corpo sadio pelos exercícios e pelo trabalho, e a boa educação europeia em constante uso. Corrobora para isso a biblioteca do navio e o forte espírito protestante que marca toda a narrativa do que na verdade é um manual altamente moralizante.
De todas as passagens, vale a pena destacar, como ponto alto neste romance sem grandes intenções literárias dadas a clímax, o primeiro dia de descanso da família (que, como se espera, foi num domingo). Nesse dia, o pai senta-se e conta à família a história de duas terras pertencentes ao mesmo Rei: o Reino da Possibilidade, ou da Noite; e o Reino da Realidade, ou do Dia. No primeiro, longíquo, escuro e frio, nada se fazia, e a inatividade era a nota sonante do lugar. No segundo, operava-se o milagre da ação e das grandes realizações, e ali morava o Rei em Himmelburg, o Castelo Celeste, com os bons súditos, em meio a muita luz, paz, produtividade, e a vestimentas mais brilhantes que a prata. Ora, decide o Rei dar aos moradores do Reino da Possibilidade de passarem ao Reino da Realidade. Para isso, realizariam o trabalho de lavrar a terra, guardar um dia ao mês para discutirem as leis, descansar uma vez por semana, e observarem os respeitos e os costumes. Onde? Em Erdheim, ou Ilha Terrestre, a meio caminho de um e de outro. Juram todos obedecerem mas quando são levados para lá, poucos realmente se prendem à promessa esquecida no meio da bruma da viagem. O resultado é o esperado: de quando em quando, dois navios aportam na ilha: o Navio do Desespero e o Navio da Esperança. O primeiro aporta na orla e sua tripulação, comandada pela Morte, sai à caça de todos os preguiçosos e maus, enquanto o seguindo ancora a uma distância da praia e manda somente uma pequena embarcação com um único tripulante, que sob a ordem do comandante Vida recolhe os bons e laborosos moradores da ilha, para levá-los ao Castelo Celeste, onde morarão com o Rei e os outros súditos. No final, sobre o tamanho das embarcações e seus destinos, o pai conclui “dizendo que a Esperança sempre procurada fica distante de nós; por isso esformçamo-nos para alcançar o que ela significa ou representa, ao passo que o Desespero está sempre próximo e nos aflige com sua presença constante. [...] Os homens bons, cumpridores dos seus deveres, leais para com os outros e para consigo mesmos, têm a seu favor o bafejo da esperança que se torna realidade, ao passo que os outros tentam inutilmente fugir ao desespero, ficando enredados pelas trevas da maldade, da ignorância, da ociosidade” (WYSS, 1812; 1972: 64-5).
Independentemente da validade e da verdade contidas nesta parábola, o que ela sinaliza é a mão rígida do religioso e cidadão que se torna líder desta colônia, além de pai de filhos que mais tarde virão a se mostrar bons cidadãos. Esta aura de rididez e de forte moral, calcadas no protestantismo, são herdadas de um século em que a literatura, quando não fundada nos princípios filosóficos e iluministas da França, da América do Norte e da Inglaterra (em parte, como é o caso de Thomas Paine, autor dos Direitos do Homem), estava amplamente fundamentada na herança religiosa puritana herdada dos idos do século XVII,contra a qual o século XVIII lutou e só se viu efetivamente livre no século XIX. Mesmo assim, Robinson Suíço é uma obra que se imortalizou porque, no apagar das luzes, os princípios de cidadania, de religiosidade e de propriedade, muito bem calcados na sociedade ocidental, são os que prevalecem e nos dirigem até hoje.
Fonte de informações sobre o autor: http://en.wikipedia.org/wiki/Johann_David_Wyss
1 Comentários:
Oi Fabiana, vc conhece a versão da Família Robinson traduzida e adaptada por Alberto Maduar e ilustrada por Carlos Roberto?
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