Coleção Clássicos da Literatura Juvenil

Apresentação e resenha dos livros da coleção editada pela Abril Cultural entre 1971 e 1973.

segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Volume 33 - Raptado - Robert Louis Stevenson


Há muitas coisas a dizer em favor da literatura, mas creio que uma das principais é a de que se a História pudesse ser contada através dela, nas escolas, muitos jovens não teriam do que reclamar contra a matéria e, pelo contrário, por ela se apaixonariam. Este é o caso deste livro único do escocês Robert Louis Stevenson, Raptado, que a coleção Clássicos da Literatura Juvenil publicou como o trigésimo-terceiro volume, em fevereiro de 1973, numa tradução adaptada de forma maravilhosamente simples pela irretocável Tatiana Belinky.

A história se passa na Escócia de 1751, quando morre o pai do jovem David Balfour, pobre garoto de uma província que vem a descobrir, através do reverendo da sua cidade natal, Essendean, que seu pai era na verdade um gentil-homem (leia-se pequeno nobre local) cujo irmão vivia na capital da província, e para lá é mandado.

A surpresa é, na verdade, desagradável: seu parente, o Sr. Ebenezer Balfour de Shaws, não passa de um velho avarento que habita um solar não-acabado e que economiza até mesmo na querosene e na alimentação, posto que vive à base de mingau de aveia e cerveja. Pior ainda é saber que o tio não lhe quer bem e que conspira contra ele. A maneira como a descobre é lamentável, porque ao sair com o tio para a cidade, e ao esperar enquanto o tio conversa com o capitão Hoseason, do navio Covenant, David é atingido na cabeça, por trás, e acorda no porão do referido navio, e dali só sai quando o grumete Hansome finalmente morre por violência do segundo imediato. Ali, descobre que fora raptado a mando do tio, e daí vem o título do livro. Condenado a trabalhar para o capitão e os imediatos e a esperar que o navio chegue às “Carolinas” (terras norte-americanas, que ainda não tinham declarado sua independência do reino britânico), onde seria vendido como escravo para trabalhar nas plantações ao lado dos negros, como aliás ocorria, naquela época, com muitos gentis-homens vítimas de conspirações para lhes tomar as propriedades (e, muitas vezes, as famílias também), David não vê saída, a não ser tentar sobreviver sem apanhar e sem se colocar na mira da tripulação de homens criminosos e foragidos que ali trabalhavam.

A sorte de David gira em 180 graus quando um certo Sr. Alan de Breck, de Appin, é recolhido como sobrevivente de uma embarcação atingida, em meio à névoa, pelo Covenant. É neste ponto que o leitor começa a entrar em todas as minúcias da questão histórica britânica que se seguiu ao reinado de Guilherme de Orange, quando o Rei James I governava e o país, passando por fome, miséria, muitos desmandos e cobiça, se via à mercê dos coletores de impostos e silenciados em sua vontade política perante a ameaça da forca. Naquela época, explica o narrador a fervorosa ação da luta jacobina, que vinha da França e que desejava espalhar-se na Grã-Bretanha, como modo de derrubar do poder o rei e seus apoiadores, conhecidos como “whigs” (“perucas”), e realizar a sonhada Restauração da dinastia Stuart. Numa leitura moderna e para simplificar muito mesmo, significava a luta do partido libertário de esquerda (jacobinos) contra o poder detentor do dinheiro explorado dos pobres, de uma classe da qual faziam parte os nobres, com seus rostos empoados e suas perucas brancas (daí serem chamados de “whigs”) e várias classes de comerciantes e artesãos. Alan de Breck era conhecido jacobino que movimentava o partido político escocês e articulava as forças entre os representantes jacobinos da Escócia com os libertários franceses, e por isso viajava constantemente entre um país e outro, ainda que seu pescoço estivesse a prêmio de alta quantia de guinéus. Vendo o capitão Hoseason uma oportunidade de matar o homem retirado do mar e ficar com as coisas dele, arma um plano para assaltá-lo na cabine, mas David ouve o plano, decide-se contra o capitão e a tripulação, e luta bravamente ao lado de Alan, até quando o navio naufraga e os dois se separam.

Longa é a aventura épica que leva o sobrevivente David a encontrar o seu salvador e, com ele, escondendo-se dos “jaquetas vermelhas” (soldados do rei que caçavam jacobinos) através de charnecas, montanhas, grutas, árvores, urzes, e todo tipo de habitação escocesa apoiadora da causa jacobina, longe das terras dos “whigs”. Nesse caminho, David vai aprendendo sobre a vida nas Highlands, as terras altas da Escócia, onde os pobres eram explorados pelos homens do rei e, mesmo assim, conseguiam somar uma segunda renda para enviarem à França através de portadores como Alan de Breck, em detrimento da própria alimentação e vestimenta. Aprende, principalmente, valores como honra, coragem e amizade, e coloca à prova sua sinceridade e seu reconhecimento por Alan contra sua vontade de abandoná-lo e seguir rumo para Queensferry e ali encontrar o advogado Rankellor, para explicar a ele que era herdeiro legítimo da Casa de Shaws, pois era filho do filho primogênito (Alexander, irmão de Ebenezer). Junto com Alan, descobre que valores básicos de criação e de crença política não se mudam, já que ele mesmo é um whig, mas que pode e é capaz de conviver pacificamente com um jacobino, sem querer explorá-lo ou dele sofrer golpes ou exploração. Marcas de individualidade escocesa, que destacam a identidade nacional, são as descrições das casas, das roupas dos clãs, cuja estampa declara a origem de cada pessoa e sua filiação de clã, as canções nas gaitas, os nomes e a língua gaélica. Tais elementos David vai aprendendo conforme atravessa o país como um pobre viajante, escondendo-se e dependendo da caridade de um povo unido e ainda se ressente dos Atos de União de 1707, quando a Escócia deixou de ser um país independente para integrar o Reino da Grã-Bretanha.

Como é de se esperar, David Balfour encontra-se com o advogado e narra suas desventuras até conseguir chegar a Queensferry, companhado do amigo Alan, numa trajetória que havia durado mais de dois meses e durante a qual ele quase havia morrido doente por duas vezes. Respeitado pela comunidade e muito rico, o advogado convenientemente “esquece” o nome do jacobino e ao se encontrar com ele “esquece” também de carregar consigo os óculos, pois assim não poderia jamais reconhecê-lo, caso um dia se encontrasse em julgamento e em juramento. É em companhia de seu empregado, de de David e desse “Sr. Thomson” que Rankellor ensaia uma farsa na qual Ebenezer confessa ter mandado raptar o sobrinho e concorda em pagar para que este permaneça cativo na Escócia, onde ele é informado que o rapaz se encontrava. Ao ser desmascarado, entra em acordo com Rankellor, e o sobrinho finalmente toma posse de sua propriedade e de dois terços da renda dos Balfour de Shaws. Uma vez encontrando-se em poder de reconhecimento e dinheiro, David providencia uma soma a Alan e um navio para que ele fuja para a França, tal como originalmente fazia, e com dor separa-se do amigo.

O livro parece, e na realidade é, muito datado, mas assim nascem as narrativas históricas que ficam não porque friamente tratam de contar sob um ponto de vista a história de um povo, mas porque são o resultado direto de um sentimento e de uma vivência. O escritor Robert Louis Stevenson não só aprendeu com o pai e na universidade sobre engenharia naval e a vida no mar, mas respirou, na Escócia, a história de seu povo e de sua cultura, e mesmo tendo saído de lá e se mudado para Londres e depois corrido o mundo com um barco, escrevendo e visitando outras terras, a Escócia jamais o abandonou, e tampouco sua história pessoal. Devo explicar ao leitor, por exemplo, que “Balfour” é o sobre nome da mãe, e que em 1886, quando o livro foi publicado pela primeira vez, a luta jacobina há muito havia sido suprimida e o governo inglês estava estabelecido como grande conquistador de outros impérios e culturas, de forma que restava somente a literatura para contar, com um sabor que nem os livros do historiador Edward Thompson trazem -- porque estes, por mais abrangentes e didáticos que sejam, não têm o dom (e nem o intuito, é claro), de tornar viva a velha rixa entre whigs e jacobinos, e de mostrar que, independentemente de credo, religião, ou tempo histórico, a luta pela liberdade, pela justiça e pela igualdade sobrevivem nos corações dos homens e nas penas dos escritores. Enquanto pudermos contar com isso, poderemos saber de onde viemos e decidirmos, em algum grau, para onde vamos.

Fonte de informações sobre o autor: http://pt.wikipedia.org/wiki/Robert_Louis_Stevenson

3 Comentários:

Blogger Unknown disse...

Por um acaso tem esse livro em pdf? eu preciso mt ler ele, para um trabalho do colegio, mas nao achei em lugar algum

6 de agosto de 2015 às 19:18  
Blogger Unknown disse...

Por um acaso tem esse livro em pdf? eu preciso mt ler ele, para um trabalho do colegio, mas nao achei em lugar algum

6 de agosto de 2015 às 19:24  
Blogger Unknown disse...

AFF! Pensei q era o download da poha do livro!

5 de outubro de 2015 às 17:42  

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