Coleção Clássicos da Literatura Juvenil

Apresentação e resenha dos livros da coleção editada pela Abril Cultural entre 1971 e 1973.

segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Volume 33 - Raptado - Robert Louis Stevenson


Há muitas coisas a dizer em favor da literatura, mas creio que uma das principais é a de que se a História pudesse ser contada através dela, nas escolas, muitos jovens não teriam do que reclamar contra a matéria e, pelo contrário, por ela se apaixonariam. Este é o caso deste livro único do escocês Robert Louis Stevenson, Raptado, que a coleção Clássicos da Literatura Juvenil publicou como o trigésimo-terceiro volume, em fevereiro de 1973, numa tradução adaptada de forma maravilhosamente simples pela irretocável Tatiana Belinky.

A história se passa na Escócia de 1751, quando morre o pai do jovem David Balfour, pobre garoto de uma província que vem a descobrir, através do reverendo da sua cidade natal, Essendean, que seu pai era na verdade um gentil-homem (leia-se pequeno nobre local) cujo irmão vivia na capital da província, e para lá é mandado.

A surpresa é, na verdade, desagradável: seu parente, o Sr. Ebenezer Balfour de Shaws, não passa de um velho avarento que habita um solar não-acabado e que economiza até mesmo na querosene e na alimentação, posto que vive à base de mingau de aveia e cerveja. Pior ainda é saber que o tio não lhe quer bem e que conspira contra ele. A maneira como a descobre é lamentável, porque ao sair com o tio para a cidade, e ao esperar enquanto o tio conversa com o capitão Hoseason, do navio Covenant, David é atingido na cabeça, por trás, e acorda no porão do referido navio, e dali só sai quando o grumete Hansome finalmente morre por violência do segundo imediato. Ali, descobre que fora raptado a mando do tio, e daí vem o título do livro. Condenado a trabalhar para o capitão e os imediatos e a esperar que o navio chegue às “Carolinas” (terras norte-americanas, que ainda não tinham declarado sua independência do reino britânico), onde seria vendido como escravo para trabalhar nas plantações ao lado dos negros, como aliás ocorria, naquela época, com muitos gentis-homens vítimas de conspirações para lhes tomar as propriedades (e, muitas vezes, as famílias também), David não vê saída, a não ser tentar sobreviver sem apanhar e sem se colocar na mira da tripulação de homens criminosos e foragidos que ali trabalhavam.

A sorte de David gira em 180 graus quando um certo Sr. Alan de Breck, de Appin, é recolhido como sobrevivente de uma embarcação atingida, em meio à névoa, pelo Covenant. É neste ponto que o leitor começa a entrar em todas as minúcias da questão histórica britânica que se seguiu ao reinado de Guilherme de Orange, quando o Rei James I governava e o país, passando por fome, miséria, muitos desmandos e cobiça, se via à mercê dos coletores de impostos e silenciados em sua vontade política perante a ameaça da forca. Naquela época, explica o narrador a fervorosa ação da luta jacobina, que vinha da França e que desejava espalhar-se na Grã-Bretanha, como modo de derrubar do poder o rei e seus apoiadores, conhecidos como “whigs” (“perucas”), e realizar a sonhada Restauração da dinastia Stuart. Numa leitura moderna e para simplificar muito mesmo, significava a luta do partido libertário de esquerda (jacobinos) contra o poder detentor do dinheiro explorado dos pobres, de uma classe da qual faziam parte os nobres, com seus rostos empoados e suas perucas brancas (daí serem chamados de “whigs”) e várias classes de comerciantes e artesãos. Alan de Breck era conhecido jacobino que movimentava o partido político escocês e articulava as forças entre os representantes jacobinos da Escócia com os libertários franceses, e por isso viajava constantemente entre um país e outro, ainda que seu pescoço estivesse a prêmio de alta quantia de guinéus. Vendo o capitão Hoseason uma oportunidade de matar o homem retirado do mar e ficar com as coisas dele, arma um plano para assaltá-lo na cabine, mas David ouve o plano, decide-se contra o capitão e a tripulação, e luta bravamente ao lado de Alan, até quando o navio naufraga e os dois se separam.

Longa é a aventura épica que leva o sobrevivente David a encontrar o seu salvador e, com ele, escondendo-se dos “jaquetas vermelhas” (soldados do rei que caçavam jacobinos) através de charnecas, montanhas, grutas, árvores, urzes, e todo tipo de habitação escocesa apoiadora da causa jacobina, longe das terras dos “whigs”. Nesse caminho, David vai aprendendo sobre a vida nas Highlands, as terras altas da Escócia, onde os pobres eram explorados pelos homens do rei e, mesmo assim, conseguiam somar uma segunda renda para enviarem à França através de portadores como Alan de Breck, em detrimento da própria alimentação e vestimenta. Aprende, principalmente, valores como honra, coragem e amizade, e coloca à prova sua sinceridade e seu reconhecimento por Alan contra sua vontade de abandoná-lo e seguir rumo para Queensferry e ali encontrar o advogado Rankellor, para explicar a ele que era herdeiro legítimo da Casa de Shaws, pois era filho do filho primogênito (Alexander, irmão de Ebenezer). Junto com Alan, descobre que valores básicos de criação e de crença política não se mudam, já que ele mesmo é um whig, mas que pode e é capaz de conviver pacificamente com um jacobino, sem querer explorá-lo ou dele sofrer golpes ou exploração. Marcas de individualidade escocesa, que destacam a identidade nacional, são as descrições das casas, das roupas dos clãs, cuja estampa declara a origem de cada pessoa e sua filiação de clã, as canções nas gaitas, os nomes e a língua gaélica. Tais elementos David vai aprendendo conforme atravessa o país como um pobre viajante, escondendo-se e dependendo da caridade de um povo unido e ainda se ressente dos Atos de União de 1707, quando a Escócia deixou de ser um país independente para integrar o Reino da Grã-Bretanha.

Como é de se esperar, David Balfour encontra-se com o advogado e narra suas desventuras até conseguir chegar a Queensferry, companhado do amigo Alan, numa trajetória que havia durado mais de dois meses e durante a qual ele quase havia morrido doente por duas vezes. Respeitado pela comunidade e muito rico, o advogado convenientemente “esquece” o nome do jacobino e ao se encontrar com ele “esquece” também de carregar consigo os óculos, pois assim não poderia jamais reconhecê-lo, caso um dia se encontrasse em julgamento e em juramento. É em companhia de seu empregado, de de David e desse “Sr. Thomson” que Rankellor ensaia uma farsa na qual Ebenezer confessa ter mandado raptar o sobrinho e concorda em pagar para que este permaneça cativo na Escócia, onde ele é informado que o rapaz se encontrava. Ao ser desmascarado, entra em acordo com Rankellor, e o sobrinho finalmente toma posse de sua propriedade e de dois terços da renda dos Balfour de Shaws. Uma vez encontrando-se em poder de reconhecimento e dinheiro, David providencia uma soma a Alan e um navio para que ele fuja para a França, tal como originalmente fazia, e com dor separa-se do amigo.

O livro parece, e na realidade é, muito datado, mas assim nascem as narrativas históricas que ficam não porque friamente tratam de contar sob um ponto de vista a história de um povo, mas porque são o resultado direto de um sentimento e de uma vivência. O escritor Robert Louis Stevenson não só aprendeu com o pai e na universidade sobre engenharia naval e a vida no mar, mas respirou, na Escócia, a história de seu povo e de sua cultura, e mesmo tendo saído de lá e se mudado para Londres e depois corrido o mundo com um barco, escrevendo e visitando outras terras, a Escócia jamais o abandonou, e tampouco sua história pessoal. Devo explicar ao leitor, por exemplo, que “Balfour” é o sobre nome da mãe, e que em 1886, quando o livro foi publicado pela primeira vez, a luta jacobina há muito havia sido suprimida e o governo inglês estava estabelecido como grande conquistador de outros impérios e culturas, de forma que restava somente a literatura para contar, com um sabor que nem os livros do historiador Edward Thompson trazem -- porque estes, por mais abrangentes e didáticos que sejam, não têm o dom (e nem o intuito, é claro), de tornar viva a velha rixa entre whigs e jacobinos, e de mostrar que, independentemente de credo, religião, ou tempo histórico, a luta pela liberdade, pela justiça e pela igualdade sobrevivem nos corações dos homens e nas penas dos escritores. Enquanto pudermos contar com isso, poderemos saber de onde viemos e decidirmos, em algum grau, para onde vamos.

Fonte de informações sobre o autor: http://pt.wikipedia.org/wiki/Robert_Louis_Stevenson

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Volume 32 - Viagens de Gulliver - Jonathan Swift

Mais de duzentos anos separam o francês François Rabelais do irlandês Jonathan Swift. Mesmo assim, em se tratando da irreverência e da coragem com que trataram em suas obras as mazelas e a natureza humana, social, política, econômica e religiosa de seu tempo, ambos marcaram história com suas personagens incríveis e muito críticas. Se, em Gargântua e Pantagruel temos gigantes que desprezam e se desfazem das importâncias e "valores" franceses -- pelos quais seu autor pagou com o confisco de suas obras --, em Viagens de Gulliver, o trigésimo-segundo volume publicado na coleção Clássicos da Literatura Juvenil, Swift se vale do protagonista Lemuel Gulliver para tratar da sociedade de sua época não para fazê-la rir, mas para, em meio ao cômico e ao grotesco, despejar toda a acidez de sua crítica sobre políticos, nobres, juízes e toda sorte de pessoas que detinham o poder e o destino do povo nas mãos.

O livro, traduzido com a clareza e a simplicidade que somente escritores da lavra de Clarice Lispector conseguem empregar, é a narrativa das aventuras e desventuras do cirurgião e marinheiro Lemuel Gulliver que, durante 15 anos e mais de sete meses, vaga pelos mares do mundo, sofrendo naufrágios e passando pelas terras mais estranhas, conhecendo os povos mais inusitados.

Todos conhecem, por causa de canções, livros infantis, desenhos, filmes e peças de teatro, a famosa viagem de Gulliver a Lilliput, a terra dos homenzinhos em que ele acordou preso ao chão por meio de cordas e estacas. Mas as significativas viagens de Gulliver (há as menores que se intercalam na narrativa) são, na verdade, quatro: Lilliput e Blefuscu; Brobdingnag; Laputa; e país dos Houyhnhnms e dos Yahoos.

É preciso esclarecer ao leitor e à leitora que Jonathan Swift era um homem de seu tempo não somente porque fosse muito envolvido em questões políticas e assuntos da ordem do dia, tais como conquistas, colonizações, guerras e exploração, mas porque ele exprimia, como resultado de sua vivência e de seu grande interesse, o espírito Iluminista que caracteriza o século XVIII -- e aqui aproveito para informar que Viagens de Gulliver foi publicado originalmente em 1726, quando outros escritores satíricos, como Alexander Pope, estavam em voga.

Assim sendo, cada uma das viagens de Gulliver visava claramente a atacar um aspecto da sociedade britânica. A mais clássica é, como todos sabemos, a viagem inicial, em que o narrador encontra-se náufrago em Lilliput (Lispector grafa "Lilipute"), país de seres humanos diminutos, tão pequenos como uma régua de 15 centímetros, e cujas árvores não ultrapassam a altura das pernas de um homem de estatura mediana. De ameaça, aos poucos passa a conviver amigavelmente com a população, e torna-se amigo do imperador, chegando mesmo a auxiliá-lo na derrota da investida do país vizinho, Blefuscu, ao tentar invadir as terras liliputianas. Detalhadamente, o narrador expõe como o povo o veste, alimenta, cuida de sua "casa", e o quanto isso custa de matéria-prima, esforço e muita mão-de-obra por parte de centenas de liliputianos, o que certamente onera os cofres públicos. Paralelamente, explica que a grande rixa entre liliputianos e blefusquianos é o fato de que os primeiros quebram ovos pelo lado grosso e o segundo pelo lado fino, tendo esta diferença gerado séculos de desavença entre ambos. Explica, ainda, que para se tornar político naquele reino, exigia-se que o candidato e o próprio funcionário sempre se mantivesse em dia com a prática do malabarismo e principalmente com a habilidade de caminhar sobre a corda-bamba.

Claro está ao leitor a cena inglesa de sutilezas políticas e os meandros pelos quais a política acontece e sobrevive na corte e na jurisprudência. Também clara é a alusão das questões ridículas pelas quais países entram em questões históricas, realizando guerras e dizimando populações inteiras em nome de caprichos que muitas vezes não afeta a vida das pessoas. Está aqui a metáfora -- talvez devesse dizer metonímia -- da guerra entre Inglaterra e França, duramente criticada por Swift em outras ocasiões. A redução destas disputas e do ridículo segue o exemplo gargantuesco, que para apagar o fogo da catedral Notre-Dame, urina sobre ela. Aqui, Gulliver realiza a mesma façanha, mas sobre os aposentos da imperatriz, que considera o ato como grande ofensa e traição, motivo pelo qual Gulliver, avisado por um amigo da "bondade" e da "misericórdia" do imperador, que dali a três dias anunciaria a retirada de seus olhos e depois, em segredo, o mataria de fome, foge para Blefuscu. Fica ali por tempo suficiente para construir embarcação e voltar à Inglaterra, onde expõe os animais liliputianos que havia trazido consigo em troca de dinheiro.

Logo, Gulliver, irresistivelmente atraído pelo mar, aventura-se de novo, e desta vez o naufrágio o leva a Brobdingnag, a terra dos gigantes. Vê-se ele no lugar dos liliputianos, e entende muitas coisas que lhes diziam aqueles. A primeira é a do quão assustador é o gigante, e a segunda é a do quão feios e malcheirosos eles são. Swift não poupa as observações de seu protagonista, e explica que o seio da giganta que amamenta o bebê é enorme, manchado, feio, e que jamais gostaria de ver algo assim novamente, e que as damas da corte são malcheirosas, mas isso porque ele tem olfato muito mais sensível e que, na verdade, em seu tamanho "natural", elas devem ser muito bonitas e cheirosas, e que somente então consegue compreender quando os liliputianos diziam que ele cheirava muito mal, e o rosto dele era cheio de buracos e irregularidades, quando normalmente ele é tido como um homem branco e louro de boa aparência. É importante explicar que Gulliver só chega à vida palaciana após ter sido explorado à exaustão por um lavrador que, viajando de cidade em cidade, exibe-o como um ratinho de circo que faz pantomimas, e que somente por obra da imperatriz, que o compra já quase morto, ele sobrevive e se recupera. Poupo a grande descrição sobre a sociedade e a política do lugar, e deixo ao leitor a oportunidade de ler e compreender que a crítica à "grandeza" da sociedade britânica é aqui ridicularizada, não só porque é Gulliver, o inglês, que a gora se vê pequeno como o Polegar das histórias infantis, mas porque ele observa, estando ele pequeno, o quanto as pessoas quanto menores são, mais discutem e disputam pelas ínfimas coisas, e o quanto a sabedoria e a justiça daqueles que dispõe de força e grandeza são bem maiores.

A terceira viagem de Gulliver faz com que ele encontre o país mais estranho: Laputa. Trata-se de uma ilha sobreposta a uma terra, e nesta ilha vive a nobreza e seu rei, controlando e oprimindo a população, composta dos mais excêntricos cientistas. Em Laputa, reinam a matemática e a música sobre todas as ciências -- todas mesmos, de forma que casa são estranhíssimas e desmoronam, suas são tortas, e lavouras são desordenadas e sem produtividade --, e sobre a terra que fica embaixo da ilha flutuante há a academia de gênios que tentam em vão provar suas teorias e experimentos, para o desespero da população que, perdida em contemplação do infinito, da probabilidade e despregada da realidade e da produtividade, não vive, de fato. Não só o autor condena o "se" em prol do empirismo, que é, como sabemos, um dos conceitos valorizados no Iluminismo, como aproveita para atacar massivamente, através dos exemplos mais absurdos (como o do cientista que tenta transformar excremento em comida, num caminho reverso da digestão), a Royal Society of London for the Improvement of Natural Knowledge (Sociedade Real de Londres para o Avanço do Conhecimento Natural), a equivalenta à francesa Academia de Ciências, em que semelhantes disparates ocorriam e onde se investiam grandes quantias de dinheiro sem que houvesse resultado produtivo à sociedade. Esta, afinal, era quem pagava por tais iniciativas.

Finalmente, Gulliver se vê náufrago, vítima de motim em seu próprio navio, numa terra onde cavalos são inteligentes, compassivos, educados, e onde seres humanos estão reduzidos à selvageria e pouco se parecem com ele, porque andam com os quatro membros, têm garras no lugar de unhas, e muitos pêlos que lhes cobrem os corpos. Esses são chamados de Yahoos (sim, é daqui que saiu o nome da empresa e do site Yahoo!), ao passo que os cavalos são conhecidos como Houyhnhnms. Aos poucos, Gulliver aprende a linguagem dos cavalos e convive por mais de três anos com o chefe deles. Durante este período, ao mesmo tempo em que explica para o "amo" Houyhnhnm sobre a capacidade humana de conviver, conhecer, transformar conhecimento em ciência e usá-la em prol do avanço e da conquista, ele se dá conta da pequenez, da crueldade, da frieza e do quanto o ser humano é capaz de machucar e de desprezar e trair em favor da ganância e da avareza. Envergonhado, recebe em troca a educação e o modo de vida dos sábios cavalos, aprendendo com eles um modo de vida simples, regrada, de moral e de respeito mútuo. Pouco a pouco, aprende a desprezar o ser humano, mas ele se vê obrigado a voltar à sua terra natal porque os cavalos consideram que ele, ainda que civilizado, era um Yahoo e, por isso, não era digno de continuar a habitar sob o mesmo teto do chefe dos Houyhnhnms. Forçado pelos marinheiros portugueses que o resgatam de uma ilha próxima à terra dos cavalos, ele é levado a Lisboa e, de lá, retorna à sua casa, onde já o acreditavam morto. Aos poucos, suportando o contato com familiares e gente próxima, torna a conviver socialmente, mas passa a preferir, para sempre, a companhia dos cavalos, numa clara afirmação na defesa dos valores iluministas em prol da razão e do desprezo à sociedade na qual ele, Swift, habitava.

Como o leitor e a leitora podem ver, longe de ser bonitinho, Viagens de Gulliver apresenta como recursos narrativos o cômico e o grotesco, numa linguagem em primeira pessoa, tal como vemos em outras obras célebres da época -- por exemplo, Candido, de Voltaire --, para fazer a defesa de uma sociedade em que a justiça, a liberdade, a moral, o respeito e a razão fossem as velas apoiadas em mastros de sabedoria e humanidade -- em suma, muito diferente do que países em franca expansão econômica eram, certamente, muito diverso do que hoje nós infelizmente testemunhamos.


Fonte de informações sobre o autor: http://pt.wikipedia.org/wiki/Jonathan_Swift

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Volume 31 - A volta ao mundo em 80 dias - Julio Verne

Dentre os livros escritos por Júlio Verne, A volta ao mundo em 80 dias talvez seja o mais famoso dentre até mesmo aqueles que não são leitores costumazes. Originalmente publicado em 1872, o livro conta a grande aventura empreendida por Fíleas Fogg de dar a volta ao mundo em 80 dias.

Fíleas Fogg é um aristocrata cuja vida é calma e extremamente regrada. Mais do que isso, a própria personalidade de Fogg é rígida e, aparentemente, não se altera por nada. Ele tem hora determinada em seu dia para acordar, vestir-se, fazer a barba, ir para o clube, almoçar, ler os jornais, jantar, jogar uíste com os amigos, retornar à casa, deitar-se e dormir.

Ocorre de, em um belo dia, discutir-se no clube a (in)viabilidade de realizar uma viagem em torno da Terra, chegando ao mesmo ponto ao cabo do tempo discutido. Sempre atualizado com as mais novas opiniões publicadas nos jornais londrino, o elegante e calmo senhor inalteradamente argumenta que, com base em matemática, e contando-se com os imprevistos, é perfeitamente possível empreender tal aventura, e por isso aposta vinte mil libras -- metade de sua fortuna -- que é capaz de realizar tal empreita. Uma vez acordada a aposta, Fíleas imediatamente dirige-se à sua mansão para informar ao seu empregado, o francês com o sugestivo nome de Jean Passepartout (mais conhecido como Fura-Vidas), contratado naquele mesmo dia pelo senhor Fogg, que deveriam partir imediatamente. O percurso prevê o seguinte caminho: Londres, Suez, Bombaim, Calcutá,Hong Kong, Iocoama, São Francisco, Nova York, e finalmente Londres novamente.

Se não bastasse a grande viagem em si, com riscos de acidentes e atrasos, a aventura torna-se ainda mais emocionante porque Fogg é confundido com um ladrão de bancos, e o detetive Fix decide-se a segui-lo através dos países, sempre esperando encontrar, no próximo posto, uma ordem de prisão para que possa prender Fogg. Esta, sempre atrasada, faz com que a viagem vá cada vez mais adiante, ainda que Fix tente retardar esta viagem através de artimanhas.

Dentre a série de aventuras, uma das maiores é o resgate de uma indiana que, morto o marido, é obrigada a participar do funeral deste e ser queimada ainda viva na pira funerária. Aouda é seu nome, e Fura-Vidas, imbuído do espírito heróico de Fogg, o protagonista deste romance de aventuras, consegue resgatá-la. A fuga dá-se por elefante, por trem, por quaisquer meios por terra e água, o que certamente dilapida a fortuna de vinte mil libras que ele carrega para esta viagem, durante a qual a moça resgatada paulatinamente apaixona-se por Fogg, sem que este demonstre qualquer sentimento além de educação e constante cortesia.

Ora, dá-se que, ao chegar na Grã-Bretanha, após tantas peripécias, Fix finalmente o retém com sua ordem de prisão, e por isso, Fogg permanece numa cela. Somente quando Fix descobre que o verdadeiro ladrão havia sido preso três dias antes é que o aventureiro Fogg vê-se liberto, mas sem chance de chegar a Londres em tempo de cumprir a aposta. É neste momento que ele se acredita pobre, e é justamente quando Aouda revela seu amor, oferecendo-se como esposa ao homem que finalmente confessa amá-la. Fogg não se dá conta, entretanto, que ao viajar em sentido leste, "ganhou" vinte e quatro horas, pois a cada grau avançado economizou quatro minutos do dia. É Fura-Vidas que descobre o fato, e arrasta-o ao Clube Reformador exatamente no minuto em que havia tratado de estar de volta, e a ordem se restabelece, terminando o romance no fim esperado.


Já comentei neste blog, por ocasião das resenhas de outros livros de Verne, acerca da genialidade do escritor, e ele não deixa por menos em ousadia e construção de narrativa com altos e baixos. Vários outros são tão maravilhosos quanto este, como é o caso de Cinco semanas em um balão e Da Terra à lua. No entanto, dos três títulos do famoso escritor francês publicados na coleção Clássicos da Literatura Juvenil, este é o que, do ponto de vista de inventividade, é mais modesto: não invade a terra, não percorre os oceanos, não perfura o pólo sul, mas de forma bastante eficaz faz uso da imagem cristalizada da cultura e da personalidade britânica.

Por outro lado, não deixa de apresentar a narrativa onde há um protagonista metódico e científico, um auxiliar forte e corajoso, contratempos, muita aventura, e o amor de uma linda mulher. E, no que diz respeito a esta estrutura e às emoções do livro, Verne não deixa por menos e imortaliza sua obra, numa época em que a volta ao mundo feita em 80 dias era realmente algo impraticável. Pensem o leitor e a leitora, por exemplo, no que seria viajar pela selva da Índia, através de estradas de ferro não terminadas, correndo o risco de serem atacados por tribos tanto ali na Índia quanto nos Estados Unidos, onde os indígenas se viam -- aqueles que haviam sobrevivido ao extermínio e à fome -- sob forte pressão para defender sua cultura e seu território. Obviamente, hoje a mesma viagem pode ser realizada, segundo meus cálculos, em um tempo absurdamente menor -- contando imprevistos e viagens de metrô, ônibus ou trem, cerca de uma semana, a um custo inicial de 20 mil libras (atualizadas) para os mesmos três passageiros, excluindo-se lembrancinhas e imprevistos, como os inúmeros subornos que Fogg paga para que se acelere a viagem, sempre que possível. Mas, certamente, ela não teria o charme e o sabor desta que encantou gerações inteiras de leitores e espectadores de teatro e, como é de se esperar, cinema. Resta ao leitor e à leitora, pois, conferirem-no.

Fonte de informações sobre o autor: http://pt.wikipedia.org/wiki/Julio_Verne



segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Volume 30 - A rapaziada de Jô - Louisa May Alcott


Imagino que seja intencional, por parte da equipe de editores, publicar A rapaziada de Jô, um romance eminentemente feminino, logo em seguida a Aventuras de um petroleiro. Equilibra-se, assim, os gostos da audiência da coleção Clássicos da Literatura Juvenil, ao mesmo tempo em que se mantém um fluxo constante de consumo das edições quinzenalmente publicadas.

Tal como o leitor e a leitora devem ter deduzido, esta é a continuação de Mulherzinhas (publicado nesta coleção como volume 16) e mantém o mesmo gênero de romance para moças que gerou a fama de Alcott ainda em vida. Nesta narrativa, o leitor retoma a vida das irmãs March -- agora, viúva Amy (Amélia) Brooke, Sra. Jô (Josefina) Baher, e Amy (Amélia) Laurence -- dez anos a partir do ponto em que a primeira narrativa foi interrompida. Faleceram a Sra. March e a adoentada Beth; e no lar reformado e transformado em escola Plumfield, cresceram os gêmeos Daisy (Margô) e Demi (Semi) Brooke, nasceu a caçula Josie Brooke; nasceram os irmãos Ted e Rob Baher; nasceu a artística e preciosa Bess Laurence, num casamento perfeito da beleza e dos dons de seus pais; e foram acolhidos e criados muitos jovens, como a dedicada estudante de medicina Nan, seu enamorado Tom, o musicista Nat, o marinheiro Emílio, o rebelde e independente Dan, dentre outros e outras jovens que figuram na história.

Neste lugar idílico que é Plumfield, chamado pelas personagens de Parnaso, onde o velho Sr. March é professor e conta histórias como Homero, e onde as musas inspiradoras devotam dons, tempo, amor e caridade aos aspirantes à arte e ao crescimento da alma e do caráter, desenrola-se as tramas de cada uma das jovens personagens. Neste teatro oitocentista em que exala o romance romântico à la José de Alencar, Alcott encontra lugar para enredar tramas que destaquem o caráter dos rapazes e das moças: há o marinheiro indômito, leal e corajoso; o boa-vida que expia sua ilusão e torna-se um dedicado estudioso da música; o desbravador do oeste que se apaixona perdida e secretamente pelo mais belo alabastro que é a jovem Laurence; o estouvado e irresponsável jovem, temperado pela sabedoria e paciência de seu irmão; o perdidamente enamorado que se descobre depois amando outra; o jovem jornalista que desiste da carreira e se torna editor; o frágil e deficiente físico, que não encontra ali seu espaço. Por parte das mulheres, logo uma leitora se identifica com a recatada dona de casa; outra se vê na pele da jovem aprendiz de atriz; outra ainda experimenta a sabedoria de culturas diversas que muitas viagens marítimas trazem, tornando-a corajosa e companheira nos momentos felizes e no perigo de morte -- ou, ainda, há a oportunidade para a leitora se ver na pele da jovem corajosa que contesta a condição feminina e se torna médica, não se casa, e requer o direito de voto. Com tal gama de personagens e subenredos, o narrador apresenta-se maleavelmente na trama, embora esta siga o rigoroso estilo do século XIX e não costure de forma imperceptível as histórias, já que as aventuras são contadas em capítulos separados, num rigor narrativo bastante previsível que, a certa altura, por mais doce que seja, acaba cansando seu público.

Salva-se o romance pela inteligente ação de Jô, carinhosa e sábia mãe que aconselha, aparta, orienta, diverte, consola e agrada seus "filhos" -- pois todos são, para ela filhos queridos do coração que alegram a casa e dão vida ao velho solar transformado em colégio. Desta forma, se por um lado Alcott não alcança a inocência e a magnitude de Mulherzinhas, um romance adolescente tão doméstico e idílico, ela consegue, em A rapaziada de Jô, manter o mesmo espírito idílico (aqui, propositadamente pastoril), embora haja aqui um elemento novo: o outro que vem de fora e segue para fora, para o mundo desconhecido.

Neste livro de 1886, a Europa brilha em espetáculos, em vida boêmia, em arte, em fascínio pelo moderno, pelas vanguardas que logo virão, e os mares são as rotas comerciais amplamente exploradas pelos cargueiros que fazem a fortuna de jovens audaciosos, transportando os produtos americanos e enriquecendo a nação. Esta efervescência casa-se bem com a domesticidade e o ambiente pastoral de Plumfield porque ali existem as aventuras individuais de cada personagem que se descobre crescendo.

Todavia, "romântico", "pastoral" e "doméstico" não são sinônimos de fraqueza ou de incapacidade. Neste novo mundo que se abre ao casamento entre o velho e o novo, entre a tradição e a modernidade, impera a força espartana formadora do caráter e da moral, e os fracos não encontram lugar. Logo no início da narrativa, não se deixa dúvida para esta questão: "O pobre Dick morreu, bem como Billy: talvez tenha sido melhor assim, pois a vida jamais sorriria feliz àquelas duas criaturas, deficientes física e espiritualmente" (ALCOTT, 1886; 1973: 11). Não se espante com esta fala "corriqueira" e condescendente, e lembre-se de que devemos olhar pelas lentes do contexto que gerou a obra. Por isso, numa época em que a beleza, a força física, o status social e o capital -- porque, o tempo inteiro, o narrador fala sobre a benesse de se ter dinheiro e de poder ser caridoso, ajudando a tantos quandos é possível --, são muros indestrutíveis contra os quais "deficientes física e espiritualmente" (e, portanto, doentes) nada podem. Assim foi, por exemplo, para Beth March, a jovem e frágil irmã que, não resistindo, sucumbe e não compartilha a felicidade das outras irmãs. Assim é para Dan Kent, filho de coração de Jô, mas mestiço, rebelde, rude e livre demais, e por isso mesmo indigno do amor da perfeita Bess, a graça mais perfeita que a família March conseguiu produzir em suas gerações, advinda de nobre linhagem, loura, magra, frágil e branca como o mármore, jovem e inocente, e depositária de toda a cultura e a tradição da boa família norte-americana do leste -- em suma, o modelo de personagem romântica, em quem o trágico enamorado Dan morre em batalha, na defesa dos oprimidos indígenas.

De forma semelhante, aqui não há lugar para o risco capital ou o capricho da juventude. Por isso, Tom abandona os malfadados estudos de medicina, que persegue porque acredita-se apaixonado por Nan, e segue sos negócios do pai, do mesmo modo em que Demi abandona a arriscada carreira jornalística para se tornar editor e, mais tarde, sócio do editor, e Nat decai na sociedade europeia porque não pode nem bancar sua vida de luxo e desperdício, e nem possui "berço" que lhe garanta o estilo de vida, restando-lhe pois o duro e longo caminho do estudo e do aperfeiçoamento através de treino e de trabalho assalariado.


Na trama em que tudo acaba em seu devido lugar social e moral, onde todos descobrem seus caminhos, nem mesmo o desencaixe de Dan é imperfeito. Talvez, somente o tom insinuadamente dramático -- num fim em que se declara que "agora, tendo procurado satisfazer a todos com muitos matrimônios, poucas mortes e muita felicidade, deixem que as luzes se apaguem e que o pano caia para sempre sobre a história da família March" (ALCOTT, 1886; 1973: 222) -- seja exagerado. Mas, de novo, como não poderia sê-lo, resultante que é de uma época e de uma escolha literária? Dramático demais ou não, A rapaziada de Jô cumpre o papel de retratar a época, agradar a todos e amarrar a história das personagens meninas que cresceram representando o norte norte-americano e, como tal, perpetuaram esta trajetória.

Fonte de informações sobre a autora:

http://pt.wikipedia.org/wiki/Louisa_May_Alcott (em português)

http://es.wikipedia.org/wiki/Louisa_May_Alcott (em espanhol, mais completo)


segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Volume 29 - Aventuras de um petroleiro - Richard Armstrong

Há quem possa dizer que Aventuras de um petroleiro é um livro dirigido a meninos e meninas, mas a minha experiência de leitura faz com que eu me incline, de forma bastante convencida (porque a mim convenceu), a afirmar que o volume 29 da Coleção Clássicos da Literatura Juvenil, escrito por Richard Armstrong, é voltado primordialmente ao público de jovens garotos, desejosos de aventurar-se através dos espaços que somente a literatura, numa vida já atribulada e plena de atividades de educação e formação, lhes dá.

Trata-se da viagem de travessia do petroleiro inglês Cape Wrath, no início da Segunda Guerra Mundial, da costa canadense até a irlandesa. Comandado pelo experiente Jack Holroyd, conhecido como Old Man (ou, como muitos se referiam por trás, Jack Olho-de-Peixe), o petroleiro alinha-se com outros navios num comboio, numa tentativa de protegerem-se uns aos outros dos atraques nazistas e, assim, chegarem sãos e salvos em terra.

A aventura tem início quando resgatam dois náufragos num barco, à deriva, e se vêem atacados por um submarino. Só não sofrem avarias maiores devido à grande experiência marítima do capitão, já que sua parca munição não fazia frente à estrutura bélica do submarino. Como resultado desta tentativa de fazer sucumbir o navio, afastam-se do comboio, mas logo retomam o rumo e conseguem alcançá-lo, por meio de manobras que incluem soltar grande fumaça no ar para encobrir seu rastro. Tal manobra parece não funcionar e, mais tarde, vêem-se diante de um verdadeiro fogo cruzado: não só o baleeiro do comboio vai a pique, como eles próprios sofrem ataques de granadas, metralhadores e canhões. Sendo um cargueiro de petróleo, logo são invadidos pelas chamas assustadoras, enquanto rios de petróleo cobrem o mar à volta e os gases petrolíferos lhes queimam os olhos e dificultam a respiração.

É neste momento que, com a ajuda do fiel Bull Barlow, o capitão Holroyd salva a maioria da tripulação e os coloca em dois barcos salva-vidas, não sem antes fazê-los atravessarem o fogo em direção aos barcos. O que deixa para contar, já seguros e à deriva, é que fora atingido por um mastro e que está morrendo. Encarrega Bull da chefia da tripulação – reduzida à metade, porque um dos barcos some durante a noite -- , e morre. Por voltas que o enredo dá e descrevendo as agruras e as tentativas de manter o ânimo e o moral dos homens feridos e exaustos, acabam encontrando o petroleiro depois de três dias, ainda queimando e à deriva. A tarefa louca a que se empenham, pois, é tomar o navio, domar o fogo, consertá-lo suficientemente e fazê-lo funcionar, conduzindo-os, então, às costas britânicas, conforme Bull havia prometido ao capitão que faria, de forma a repatriar os homens.


A aventura é construída lentamente, e demora para conquistar o leitor – talvez, pela série de palavras muito específicas de engenharia náutica, ou por verbos mais rebuscados em português, tais como “tergiversar” (mudar de assunto) ou “perquirir” (investigar), devidamente conjugados. No entanto, é amarrada por um espírito ideológico de união e resistência que só encontramos em tempos de enormea crise, como os de guerra, em que a vida depende da união e do esforço conjunto. Além disso, é notável que o livro não faça alusão à vida na terra de nenhuma das personagens: é como se elas somente existissem para o mar, e ali construíssem o seu caráter e a sua coragem. Destacam-se, nesse processo de formação, os jovens Gib e Scruffy, que, de grumetes, passam a realizar importantes tarefas para a sobrevivência do grupo, desde cuidar de alimento e conforto para o descanso até limpeza e força física para consertar o navio e permanecer de vigia no posto, em busca de terra firme ou para previni-los da presença de outras embarcações.

Nesse sentido, Armstrong constrói, neste livro publicado em 1959, uma narrativa voltada a rapazes, e resgata, de forma bastante acentuada, aquele espírito nacionalista e indômito que constituiu frotas e mais frotas inglesas, que foi responsável pelas inúmeras conquistas, notadamente as imperialistas oitocentistas, durante a era vitoriana, quando a Inglaterra dominou boa parte da Ásia e alguns países da África (para não mencionar a América Central). Não se trata, porém, de pura nostalgia: como já disse em outras ocasiões, a literatura, como forma de arte, é resultado das condições da sociedade que a produz. Não nos esqueçamos, então, que em 1959 já havia acontecido a Guerra da Coréia, e que o mundo já vivia quase 10 anos de Guerra Fria. Não seria de estranhar que grande parte do escrito de Armstrong (que, em 1948, ganhou o prêmio Canergie de Literatura Infantil por um outro livro), marujo experiente e escritor dedicado a aventuras no mar, dedicasse a destacar o valor e a coragem britânicas, até mesmo como maneira de resgatar uma formação que auxiliaria a sociedade a formar rapazes que poderiam, sim, vir a terem necessidade de defender a nação, se as coisas no âmbito político ficassem piores.

Curioso, pois, é o título original do livro e sua relação com o nome do petroleiro: enquanto Cape Wrath significa “Cabo Ira”, numa clara alusão não só à guerra, mas à força e à determinação com que a tripulação retoma, resgata, e dirige o petroleiro, conseguindo entregar ainda 10 mil toneladas de petróleo na costa escocesa, o título do livro é The Lame Duck – o que, numa tradução literal, significa “pato manco”, mas também é usada como “bode expiatório” (principalmente na política). Ora, numa situação em que se quer atacar um comboio, o petroleiro, ao mesmo tempo em que serve de bode expiatório para atrair os submarinos para o comboio, é também o “pato manco” sobrevivente que, apesar de todas as desventuras, aporta com sucesso -- e sem a ajuda de ninguém a não ser de sua própria tripulação. É pena, por fim, que esta narrativa sofrida no que diz respeito à sobrevivência de suas personagens não convença o leitor moderno, espectador da TV e que logo veria o homem pisar na Lua, não convença este mesmo leitor sobre a grandeza e a lealdade que outrora a Grande Mãe Inglaterra despertava com paixão em seus pequeninos. Porque, no final das contas, a ideologia pura e inocente, que não considera o seu tempo, não sobrevive se a este não se mesclar.


Fonte de informações sobre o autor (em inglês): http://en.wikipedia.org/wiki/Richard_Armstrong_(author)