Volume 28 - Nevada - Zane Grey

O que não contei lá atrás eu deixei para contar agora, enquanto mote desta trama: esta narrativa tem início do ponto em que parou a anterior, quando, para salvar as famílias Ide e Blaine da bancarrota, Nevada mata o bandido Les Setter e, por isso, foge da California, não deixando nada atrás de si além de poeira levantada.
Nevada é o livro, então, que dá conta de relatar ao leitor, em terceira pessoa, na voz de um narrador que penetra na cabeça das personagens de acordo com sua conveniência (este é o chamado narrador onisciente), a vida pregressa de Nevada e a grande aventura que ele encontra, anos depois, erradicado no estado norte-americano do Arizona. Pois é para lá que Ben Ide, junto de sua esposa Ina, seu filho Blaine, sua irmã Hattie, sua mãe e seu jovem cunhado Marvie seguem, com uma comitiva de trabalhadores, em busca de um clima mais seco e mais quente, em uma terra inculta onde possam estabelecer novo lar.
Ora, dá-se que é justamente naquele lugar em que uma enorme e misteriosa quadrilha de ladrões de gado atacam estancieiros e roubam-lhes o gado, em enormes quantidades. Ben compra a fazenda que, quatro anos antes, Nevada -- na verdade, Jim Lacy, conhecido por roubo de gado e cavalos, por bebedeira e jogos de azar e, sobretudo, por ser exímio e muito respeitado pistoleiro -- havia sido capataz. Agora, sob o disfarce de Texas Jack, o misterioso e solitário caubói, com a bênção da lei do condado, resolve se embrenhar no meio de bandidos e tornar-se jogador e ladrão, retomando a antiga vida, disposto a ir até o fim para desmascarar a enorme e perigosa quadrilha que mantém o negócio de roubo de gados e morte de fazendeiros, na região, porque descobre que o mais lesado dos fazendeiros é senão Ben Ide e sua amada Hattie, a quem ele jamais esquece.
Zane Grey organiza o enredo de forma semelhante a Caçadores de Cavalos e, assim, há três histórias entrelaçadas neste romance: a perigosa aventura de Jim Lacy em busca do desmascaramento do bando Pine Tree e de seu chefe -- que nada mais é do que o sobrevivente da guerra do Texas, companheiro de Billy the Kid, e que estrategicamente coloca-se como capataz e homem de confiança de Ben --; a história de luta de Hettie pela terra que possui com o irmão e pelo amor de Jim Lacy/ Nevada/ Texas Jack; e a história de amor de Marvie Blaine (o pequeno Marvie, cupido na relação de amor entre sua irmã Ina e o então renegado Ben Ide) e Rose Hatt, pobre filha de uma quadrilha de ladrões da qual o maior perigo é seu irmão mais velho, Cedar Hatt.
Falas melodramáticas, grandes expansões e arroubos de amor e de lealdade, e lições de moral e de ideologia norte-americana do homem que seu autoconstrói (o famoso self-made man) estão mais do que presentes neste trabalho bem elaborado do escritor que abandonou sua carreira de dentista para viver de literatura. Uma das que mais se destacam é a do juiz Franklidge ("curiosamente", uma mistura de "Franklin", um dos notáveis presidentes e fundadores da nação norte-americana, e "judge", que significa "julgar; julgamento"), acerca do cenário e do tempo histórico em que vivem:
Quero tornar claro em seu espírito exatamente o que homens como Jim Lacy
O aspecto interessante a se observar, neste trecho que é uma lição de literatura e sociedade norte-americana, não é a apologia à violência -- até porque esta era, numa terra em que a sociedade estava ainda sendo construída, quase inexistente, senão inexistente de fato --, mas a clara crença na capacidade de autorregulação social, na aceitação de que os fortes sobrevivem e de que, mesmo assim, depende dos que são ainda mais fortes, que possuem "nervos de aço" para regular a sociedade, guiando-lhe através das florestas desbravadas e dos campos arados.
Torno a afirmar, então, o caráter reafirmador de identidade nacional que este livro apresenta, e sua ampla utilizada em anos posteriores à sua publicação, quando mais do que nunca, como expliquei por ocasião da resenha de Caçadores de Cavalos, a sociedade norte-americana precisava de uma tábua de salvação para se reeguer do crash de 1929. O aspecto utilitário do livro não é ruim -- desde que, é claro, se deixe claro o limite entre realização utópica da construção de uma vida (em que o leitor sente-se na pele do herói) e a vida que, criticamente, o leitor leva, e à qual retorna a cada leitura destas muitas e inesquecíveis aventuras apresentadas nesta coleção.
Fonte de informações sobre o autor (em inglês): http://en.wikipedia.org/wiki/Zane_Grey